30.11.11

Impressões de perto do final, porém não conclusivas.

Inquietude. O desejo de se sentir em casa. Do pertencimento.

Depois da descoberta de que tinha que deixar o País dos Intocáveis o mais breve possível, começou o movimento de desfazer o pequeno apartamento de pouco menos de trinta metros quadrados. Aquele pequeno apartamento que mal havia começado a dar aconchego... Que há pouco começava a ser chamado de casa. Mas não havia mais tempo para isso. Era hora de refazer as malas, desmontar os móveis e montar as caixas. Era chegada a hora de deixar aquele país simpático, mas que nunca lhe pareceu interessado, que lhe tinha sempre um quê de inércia quando se tratava de conhecê-lo mais profundamente.

É, é assim que ela vai sair daqui. Sem saudades, só com lembranças de um tempo quando a vida foi um sonho estranho. Quando a neblina do fim do outono, que às vezes perdurava por dias a fio, parecia mais acolhedora do que os dias ensolarados. A neblina acobertava os espaços vazios e o longo tempo que ainda estava por correr até a tão almejada partida. Os minutos e as respirações se comprimiam naqueles brancos dias de nuvens.

E assim parte. Do lugar onde um sorriso é um meio sorriso. Onde a casa é quase um lar. Onde o sol quase esquenta. Onde o inverno é quase frio. Onde no cardápio mal traduzido em inglês, serve-se ‘frango morno’ [‘lukewarm chicken,’ how sad is that?]. (Ato falho?) Onde as meninas e os meninos são quase muito bonitos. Onde a mais pungente das manifestações climáticas é a cortina de neblina, quando o céu vem à terra e os sonhos e as realidades habitam a mesma dimensão. Onde se é quase feliz, mas falta...

Mais triste do que partir é partir sem saudades. É partir para esquecer.

5 comentários:

  1. Tomara que esse lugar um dia, possa se ter dele uma mudança de opinião e assim não somente dizer a respeito: "um quase..."

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  2. Lukewarm chicken, lukewarm country. Que bom que a partida foi possível, praticamente encorajada. Que a sensação de pertencimento venha com a mudança!
    Beijos!

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  3. Belo e sentido texto, filhona. Por sorte, há lugares do não-quase, e, como disse o Anônimo, quiçás algum dia se possa ter desse país uma mudança de opinião. Curiosamente, é o lar dos exilados, dos perseguidos e a casa da tolerância (no melhor dos sentidos). Boa viagem de volta pro lar! bjs

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  4. 'Ainda pior que a convicção do não é a incerteza do talvez, é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi. Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu está vivo, quem quase amou não amou. Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono. Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos Bom dia, quase que sussurrados. Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza. O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si [...] Embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu.’

    Luís Fernando Veríssimo/Sarah Westphal

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  5. Vais levar um pedaço grande de bog aí dentro de ti. E, como da primeira que conversamos sobre o país dos "quases", isso vai dar um olhar mais pungente ainda pra tua cria feita de letras. E isso não será quase. Será fundo, mas só depois. Talvez um fundo sentido só por quem ler as tuas palavras na tese, jamais por ti. Talvez seja essa a maldição eterna de quem escreve, ainda mais sobre os labirintos de tradução e neblina. Eu acho bonito.

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